Aos fracos coragem, aos corajosos humildade
Dona Lucilia age nas almas de um modo muito suave, transformando as pessoas como que sem elas se darem conta. Nem é preciso fazer grandes propósitos; é necessário que ela seja constante, e não nós. Durante os acontecimentos previstos em Fátima, ela terá um papel muito importante, dando aos fracos coragem, aos corajosos humildade, e a todos muita união com Nossa Senhora.
Todo convívio é composto de dois elementos: um estado de alma e um modo de tratar.
Um fundo de contínua contemplação
O convívio com mamãe era meio indefinível, porque o estado de alma dela era um fundo de contínua contemplação. Tratando dos assuntos domésticos com alguém, ela o fazia de modo semelhante a duas pessoas que estivessem conversando dentro de um santuário. Seu fundo de alma era sempre sacral, sério, elevado e muito respeitoso. Isso era uma coisa estável, fixa, embora a sacralidade tenha crescido com o tempo.
Este era o estado de espírito com que ela levava a conversa, com uma grande benevolência para com a pessoa com quem falava, mas uma benevolência temperada por uma espécie de intransigência vigilante. Se alguma coisa tocava nos princípios morais, ela rejeitava e não cedia, e criava ambiente por onde aquele erro não tinha cidadania. Não era uma pessoa espirituosa, mas uma ouvinte muito atenta de tudo que se narrava a ela, e era interessante contar-lhe, porque mamãe tinha pequenas repercussões curiosas, dando ânimo, nunca com azedume, sempre com confiança na Providência de que as coisas darão certo, de maneira que perto dela se sentia animado e confortado continuamente.
O trato era invariavelmente feito de um misto de afeto e de respeito. Ela respeitava qualquer pessoa, por mínima que fosse, no grau daquela pessoa, não era igualitária em nada. Sempre com um modo de dignidade que com ela não se facilitava. Não havia possibilidade de brincadeira desrespeitosa ou impertinente.
Mas o que proporcionava perfume a tudo isso era um desapego contínuo. Sempre pronta a se sacrificar por qualquer um, de qualquer forma, a qualquer hora, de boa vontade, só faltando agradecer à pessoa pela oportunidade de sacrificar-se por ela. Nunca a vi carrancuda. Assim era ela na intimidade, o tempo inteiro, nas menores coisas.
Ao lado disso, a afabilidade mais carinhosa que se possa imaginar para as crianças, a flexibilidade para ajudar de qualquer modo, com muita elevação. Entretanto, uma elevação que eleva os outros, em vez de achatar, com o olhar de uma pessoa que não presta muita atenção nas coisas concretas e, sobretudo, não está posta em si.
Em uma criança educada, no contato com uma senhora assim, toda a inocência primeira tem um elemento de estímulo enorme, no sentido de considerá-la como paradigma de pessoa como se deve ser, que abre uma clave e gera um ambiente que ninguém mais cria.
Inspirou e preservou a inocência primeira de Dr. Plinio
Era uma coisa única! Quando estava com mamãe, eu sentia entrar numa atmosfera luminosa, fluida, invisível e visibilíssima criada por ela. A inocência primeira cantava e se encantava. Por vezes, quando ela me contava uma história, eu ficava prestando mais atenção nela do que no enredo.
Isto me serviu também de elemento de preservação, até mais ou menos fazer vinte anos. Ela servia de abastecimento contínuo para a fidelidade ao meu ideal, e de certa forma representava esse ideal, que ela possuía de um modo vivo, mas não saberia apresentar em termos doutrinários. Era eu quem fazia a doutrina sobre o que era mamãe, e que ela não sabia explicitar.
Em certo momento o papel se inverteu e eu comecei a dar-lhe doutrina. Ela prestava muita atenção e se via que aquilo entrava fundo em sua alma. Por exemplo, a devoção a Nossa Senhora.
Ela me inspirou a inocência primeira e depois a preservou, evitou que ruísse, dando-me muitos elementos para formar a arquetipia do homem como deve ser.
Para isso mamãe contava muitas histórias de pessoas do tempo dela. Os personagens eram arquetipizados por ela. Assim, mamãe formava arquetipias um pouco baseadas na legenda e um pouco na História. Como a alma dela tinha muito do que ela modelava, uma coisa completava a outra, e ensinava como deve ser um varão verdadeiramente católico.
A impostação de alma que se deve ter é deixá-la atuar, porque ela age na alma de um modo muito suave, de quem não pede licença para entrar, de maneira muito íntima, interna e ao mesmo tempo com uma certa força de influência que transforma a pessoa, como que sem esta se dar conta. Nem é preciso fazer grandes propósitos. É necessário que ela seja constante, e não nós.
Após sua morte, Dona Lucilia tem tido uma atuação que nunca imaginou quando estava viva. Acredito que nos acontecimentos previstos em Fátima ela terá um papel muito importante, dando aos fracos coragem, aos corajosos humildade, e a todos muita união com Nossa Senhora. v
Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 23/12/1974)
Revista Dr Plinio 235 (Outubro de 2017)
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