No Colégio São Luis
Em certo sentido, eu sou filho de Santo Inácio de Loyola, pois fui formado pelos padres jesuítas no
Colégio São Luís1, cujo nome menciono com respeito e gratidão, porque nele aprendi muitos elementos preciosos de Religião, os quais constituíram, no decurso de minha vida, a alegria e a grandeza de minha alma.
Considero uma grande graça ter estudado num lugar eclesiástico e conventual, onde padres, trajando batina, me ensinavam enquanto membros de uma ordem religiosa; onde pairava um certo estilo que penetrava pelos poros e se inalava, no ar, uma atmosfera, ao mesmo tempo intelectual e sacral, a qual me agradava muito e me fez um enorme bem.
Esse espírito de força, disciplina e interioridade continha uma atitude teórico-prática diante da vida, dotada de uma lógica incomparável, cuja coerência, limpidez e precisão me encantaram, e que vinha, em última análise, da alma sagrada, fogosa e cavalheiresca de Santo Inácio. Por isso, falo com entusiasmo da Companhia de Jesus, a qual amei com toda a força que em mim podia haver. Dela fui discípulo e nela aprendi a combatividade, a perspicácia, a resistência ao mal e a norma do agere contra2.
Conscientemente deixei-me penetrar por essa influência da espiritualidade inaciana, como um todo harmônico, o qual se acrescentou a outros dois elementos: a tradição familiar com seus modos de ser católicos e, especialmente, com a presença e a ação de Dª Lucilia, bem como a educação da Fräulein Mathilde Heldmann, de quem me lembro com respeito e saudades. Esses três fatores reunidos eram emanações do espírito da Igreja e constituíram para mim favores pelos quais sou profundamente reconhecido a Nossa Senhora.
Chegando ao colégio
Sabendo que meus primos estudavam no São Luís, eu desejava ir com eles – como é natural –, mas minha mãe havia retardado esse momento, por razões que eu não entendia.
Então, entrei no colégio levado por uma miragem: a promessa de um primo meu que estudava lá. Ele me garantiu que o pátio interior do estabelecimento estava cheio de cerejeiras, as quais produziam frutas o ano inteiro e, nas horas de recreio, os alunos podiam subir nessas árvores e comer as cerejas. Assim formei a ideia de que valia a pena inscrever-me no colégio, o qual eu imaginava ser um jardim de felicidades, à maneira de minha vida. Desse modo, atraído pelas cerejas do mundo, deixei meu ambiente familiar.
Mamãe pediu a meu pai que comprasse para mim uma pasta, vários livros, um bloquinho para notas e uma caneta. Não ingressei no colégio exatamente no começo do ano letivo, mas alguns dias após o início das aulas3. Na data marcada, saí de casa munido de todo o necessário para ser um excelente aluno. Então, tive a primeira surpresa: os meus primos não passaram por minha residência para me acompanhar – como haviam prometido –, mas fui apenas com a Fräulein Mathilde. O Pinho havia garantido que entraria comigo no colégio, para me franquear o acesso às cerejas, mas quando cheguei lá ele não estava à porta me esperando…
A Fräulein levou-me ao interior do colégio, entregou-me aos responsáveis, beijou-me e disse:
– Até logo.
E deixou-me.
Todos os meninos olhavam para aquele aluno novo. Foi o meu primeiro encontro com um ambiente que não era o de minha família e tive a impressão de um mundo hostil, o qual me analisava para criticar-me.
Até então, eu vivera sob a autoridade paterna e materna, às ordens da governanta; e, nesse momento, tive a sensação de uma independência completa, pois, no modo de me relacionar com aquele mundinho que passava a ser o meu, eu não tinha pai, nem mãe, nem Fräulein: estava ali sozinho e precisava me arranjar como pudesse.
Surpresas
Sempre disposto a tratar as pessoas com benevolência e tendo boa disposição para com todo o mundo, eu estava habituado a tirar o chapéu quando encontrava alguém, ainda que fosse um menino de minha idade. Cumprimentei amavelmente os meus colegas, no sistema antigo: eles deram risada e me vaiaram. Fiquei indignado com isso, mas percebi logo que, se reagisse com a força, haveria uma pancadaria e eu estaria perdido. Então, refugiei-me numa atitude de segurança, cheia de dignidade, como se não desse importância àquilo, mas, no fundo, estava preocupadíssimo.
Percebi que os meninos se tratavam com uma sem-cerimônia única. Não se saudavam, não se diziam “bom dia”, mas iam se abordando e falando diretamente entre si, com certa nota de brutalidade.
Na sala de aula
Tive outra estranheza: ao entrar, pensei que iria diretamente para o recreio, intuindo que este deveria ficar atrás do prédio do colégio, como aliás realmente estava. Entretanto, colocaram-me numa fila, um dos padres tocou um apito e os alunos ficaram quietos. Eu, sempre muito loquaz, estranhei aquele silêncio e me perguntei: “O que é isto? Todo o mundo calado? Nunca vi mamãe fazer isso! Não estou compreendendo, mas, enfim, vou obedecer…”
Ouvi outro toque de apito e pensei: “Agora, vamos todos para o recreio”. Mas fomos para as salas de aula. Indicaram-me a classe onde eu iria estudar:
– Plinio, você vai para lá.
Era a sala do primeiro ano. Entrei e segui o bedel, o qual me mostrou a minha carteira e o local onde eu deveria depositar meus livros e outros objetos. Então, ouvi um riso e notei certa estranheza dos outros alunos, porque eu estava trajado à moda europeia tradicional, como se vestiam os meninos havia alguns anos: chapéu de feltro de um cinzento especial, chamado gris perle – cinza cor de pérola –, com as abas muito grandes e um pouco virado de lado. Lembro-me bem que usava um pulôver azul. Eu me apresentava antiquado, enquanto os meus colegas se trajavam à moda norte-americana. Estava em choque com a sala.
O professor era um padre. Ele rezou – disso gostei –, sentamo-nos e começou o ensino: tratava-se de uma aula de Geografia, muito comum, à qual assisti sem entusiasmo nem enfado.
O colégio tinha alternância de aulas e períodos de estudo, durante os quais os meninos permaneciam na sala, repassando as matérias das aulas anteriores ou preparando-se para as perguntas que os professores fariam nas seguintes. A cada duas ou três aulas havia um intervalo.
Afinal, o bedel, Sr. Olívio – homem de grandes bigodes –, bateu um sino que se fez ouvir em todo o colégio. Era chegada a hora do recreio.
No recreio
Tudo era muito organizado. Os professores terminavam as aulas e rezavam uma Ave-Maria, enquanto os alunos permaneciam em pé, junto às respectivas carteiras.
O bedel me disse:
– Você vai sair para o recreio.
Pensei: “Bem, afinal vamos para as cerejas”.
Vigiados pelos padres para manterem o silêncio, os meninos saíam pelos longos corredores enfileirados por dois, desciam as escadas, constituíam uma enorme fila geral e dirigiam-se lentamente ao pátio do recreio, enquanto o Sr. Olívio ficava na porta olhando. Esse escoamento levava mais ou menos cinco minutos.
Para a São Paulo daquele tempo, o colégio e o próprio recreio eram enormes. Aproximadamente duzentos ou trezentos alunos brincavam no mesmo pátio, o qual era dividido apenas por riscas de cal no chão, marcando a diferença conforme as idades: a divisão dos maiores, a dos chamados médios e, no fundo, a dos menores. Cada divisão era dirigida por um sacerdote, e os meninos de uma não podiam passar para a outra.
Eu saí tranquilo. Depois da aula, sobretudo, aquilo me parecia muito agradável.
Em determinado momento, um dos padres dava um toque de apito prolongado, que se ouvia de ponta a ponta e me dava a impressão de rasgar os ares. As filas continuavam andando, cada classe chegava ao seu respectivo recreio e parava. Quando estavam todos quietos, um mestre – que chamavam de padre, mas não era ordenado – dava outro apito: era a licença para falar e brincar.
Agitação e frenesi
Nesse momento havia uma explosão. A meninada se debandava, gritando e berrando a mais não poder: “Aaah! Uoooh!” Saíam correndo para todos os lados, uns em direção aos outros, com uma sanha e uma barulheira que me chocaram.
Aqueles gritos me pareceram o sumo do que não deveria ser. Pessoas educadas não fariam isso, mas se dispersariam, fazendo um pequeno cumprimento para o que estava do lado e sairiam os dois juntos, andando. Aquilo, pelo contrário, era uma espécie de orgia de gasto de vitalidade, de intemperança e de falta de ordem. Um grande frenesi absorvia e dominava completamente os alunos, e os jogos se desenvolviam em meio à tensão nervosa e à superexcitação.
Em todas as divisões havia campos de futebol. Eu tinha uma vaga noção da existência desse jogo, mas nunca o praticara, a não ser uma vez. Alguém me convidara para esse jogo e eu brinquei um pouco, mas como não gostava de exercícios físicos4, não me entusiasmei, pois eu estava habituado a outra coisa: narrações sobre antigas cortes, descrições de um mundo onde havia heroísmo, elegância, regra e distinção. Minha mãe me tinha contado, à farta, como se brincava no tempo em que ela era criança. Como esporte, havia o tênis – o qual também não me causava grande interesse –, mas nunca entrava aquela agitação em cena!
Sendo um menino em extremo calmo, a trepidação me causou um recuo interior e pensei: “Mas o que é isso? Durante a aula, eu não tinha tanta vontade de sair, nem agora estou tão alegre por ter chegado ao recreio… Sem dúvida, vou andar um pouco, para descansar do estudo, mas não com essa euforia! Eles correm sem eira nem beira! Essa agitação, em mim, não! Não se deve ter torcidas assim! Uma pessoa que se prepara para ser alguma coisa na vida deve ter conta, peso e medida em tudo! Não vou entrar nesse jogo, pois há qualquer coisa nele que avilta as pessoas!”
Senti que não tinha o direito de proceder como eles, pois estaria capitulando diante de algo que, no fundo, era muito mau.
Embora o esporte fosse altamente incentivado por alguns professores, estes não me obrigaram a jogar, ao longo dos anos em que permaneci no colégio. Nenhum deles indagou por que eu não seguia o costume dos demais e não se queixaram junto a meus pais por eu ser um menino de procedimento singular. Evidentemente meus colegas viam com maus olhos a minha abstenção, mas também não diziam nada. Jamais um menino me perguntou por que não jogava, nem ousou implicar com a fisionomia de desinteresse que eu, sem querer, fazia durante o jogo.
Brincadeiras no recreio
Uma minoria insignificante de alunos ia jogar tênis em duas quadras excelentes que havia nos fundos do pátio. Posteriormente, em certa ocasião, fiz uma tentativa de participar desse jogo, mas o esforço de correr atrás de uma bolinha não me atraiu…
Existia também um local apropriado para o basquetebol.
Outros brincavam com uma espécie de carrinhos de madeira, com duas rodas e dois varais. Um menino puxava e outro “guiava”. Às vezes, alguns puxavam, enquanto três ou quatro iam encarapitados atrás, em pé. Corriam em volta do pátio a toda pressa, apostando corrida uns com os outros e também numa enorme agitação. Depois uns desciam e os outros subiam, revezando-se nos carrinhos. Eu não compreendia qual era a graça de uma brincadeira em que a pessoa fazia as vezes de cavalo, mas eles sentiam gosto nisso.
Tive novamente um instintivo recuo interior e pensei: “Não compreendo como uma pessoa se presta a puxar outra num carro, nem entendo por que vão em pé. Não seria melhor e muito mais confortável pôr um banquinho, para irem sentados? Por que essa brincadeira tem de ser brutal e fatigante, produzindo por sua vez um suor desagradável, no meio da poeira, da torcida e do frenesi? Há nisso um gosto exclusivo do bruto, do repugnante, do feio e do errado! É o contrário do que aprendi! Por essa agitação antipática não vou me deixar tomar! Ela me mancharia em algo, o qual não percebo o que é”.
Aquilo me causava um contraste imediato com a calma nobre, recolhida e um pouco solene, que eu encontrava no lugar do mundo onde mais gostava de estar: ao lado de Dª Lucilia.
Não havia cerejeiras…
O que mais percebi no recreio? A mentira do mundo. Cheio de ingenuidade, procurei com os olhos as cerejeiras, pensando em subir numa delas para comer de seus frutos, mas não havia nenhuma… Existia apenas um bambuzal enorme, cercando o colégio por todos os lados, mas bambu nunca deu cereja… Era uma cruel decepção! Fiquei sabendo depois que nem se plantavam cerejeiras em São Paulo. Aquilo, portanto, era um mito.
Essa foi uma das primeiras más surpresas em minha vida. Quantos “pátios sem cerejeiras” eu encontraria depois!
Indignado com meu primo, comecei a procurá-lo, não só para chamá-lo e repreendê-lo por haver mentido, mas também para encontrar alguém com quem conversar, pois me era desagradável ficar sozinho naquele oceano de meninos, quase todos por mim desconhecidos.
Eu tinha combinado com vários dos meus primos que eles me esperariam no pátio do recreio, para brincarmos juntos. Inclusive um deles prometera que haveria de me apresentar a outros meninos, me ajudaria a conhecer uma série de amigos e me faria companhia. Entretanto, ele não tinha tantos amigos, nem me fez conhecer nenhum.
Ele, bem como os demais primos, passaram perto de mim várias vezes com outros alunos, no meio da folia dos carrinhos, e naturalmente olhavam para mim, mas nem sequer me convidavam para fazer parte do grupo. Tentei cumprimentá-los, chamando-os, mas eles se afastavam indiferentes e fingiam não me conhecer, evitando a minha companhia, por ver-me vestido à moda atrasada e também por saberem perfeitamente que eu iria interpelá-los. Sobretudo o responsável pela mentira percebia que eu iria por cima dele como uma fera, querendo saber onde estavam as cerejas prometidas. Ele então se esqueceu de mim completamente, sem dar a menor importância à minha decepção…
Permaneci isolado, sem criticar nem provocar ninguém, mas com ar de poucos amigos e sem fazer parte das diversões do recreio, olhando os outros meninos brincarem e pensando nesse primo que eu achava tão bom e direito, a quem admirava com verdadeiro entusiasmo e ao qual queria como a um irmão: “O que é isso?! Alguma coisa não está certa… Como ele mente desse modo? Então, existem coisas assim?”
Compreendi como o mundo estava cheio das “cerejas” da ilusão e quanto ele era repleto de realidades opressivas. Entendi também que não podia nem sequer pedir satisfação e que, se brigasse com meu primo, outros meninos iriam perguntar a causa e caçoariam de mim:
– Cretino! Não percebeu que estavam burlando você?
Ele daria uma gargalhada e diria aos colegas:
– Imagine! Esse acreditou que aqui havia cerejas!
Todo o mundo em volta riria de mim, dizendo:
– Acreditou na história! Ha-ha-ha! É o “homem da cereja”!
Percebi que, além de não ter as cerejeiras, seria ridicularizado e poderia ser chamado com esse apelido para sempre. Pensei: “Não há remédio! Ou faço um papel ridículo, ou preciso engolir a minha cólera. É difícil, mas tem de ser! Ah! Onde eu vim parar? Isto é um caos, uma vulgaridade! E este será o meu futuro, para a vida inteira!”
Era a amarga frustração de quem encontrava todo um mundo de brutalidade e desordem. Mas, além de surpresa, aquilo me causou um desejo de análise e um começo de desconfiança: “Isso não pode acontecer de novo. Não vou mais me deixar enganar. Mas, então… Quando devo acreditar ou não nas pessoas?”
Posteriormente, quando esse primo passava perto de mim e sorria, eu também sorria para ele, mas não lhe comunicava minhas preocupações, para evitar um desentendimento inútil. Eu tinha o maior empenho em conservar boas relações com os meus primos por várias razões, entre as quais estava o fato de que, apesar de tudo, gostava deles.
Brutalidade no trato
Comecei a prestar atenção naquele mundo e percebi que os meninos se tratavam com maneiras muito brutas, não por raiva, mas por um companheirismo cheio de vulgaridade. Havia esbarrões e empurrões entre eles, davam pontapés e rasteiras uns nos outros, e os que caíam diziam desaforos. Aquilo me causou muita surpresa e desconfiança.
Percebi esvoaçarem em torno de mim palavras inconvenientes, cujo sentido eu não conhecia bem, com gargalhadas e expressões fisionômicas estranhas. Alguns deles se aproximavam de mim, com modos modernos, dando-me uma palmada no ombro:
– Você como vai?
Eu, sempre muito cerimonioso com os outros – mas também exigindo cerimônia comigo –, quando cumprimentava um menino pela primeira vez tratava-o de senhor. Então, chocado com aquela familiaridade, pensava: “Mas, como ele bate no meu ombro?! Nunca ninguém fez isso! Que direito tem de fazê-lo? Quem lhe deu a permissão?”
Outros queriam envolver-me em suas brincadeiras:
– Venha, venha conosco! Entre aqui! Você não faz isto?
Respondia:
– Eu, não.
– Bobo! Bicho novo! Entra aqui!
– Não entro, já disse.
E pensei: “Não vou nessa onda! A Fräulein Mathilde não me ensinou esses métodos!”
Voltando à sala de aula
Finalmente, após meia hora de recreio, um padre tocava o apito e tudo mudava no mesmo instante. Fazia-se silêncio, acabava o jogo de futebol e quem quisesse beber água podia fazê-lo. Havia bebedouros sobre umas colunetas de cimento, dos quais saía água em esguichos ao apertar um botão.
Depois os alunos formavam as filas e voltavam para as salas de aula. Alguns deles iam deprimidos, por terem que retomar o estudo. Pensei: “Dizem que no recreio se descansa e na sala de aula se faz esforço, mas eu vou descansar daquele recreio turbulento na sala de aula, pois, ao menos aqui, eles ficam quietos”.
O professor começou a lecionar, prestei atenção no que ele dizia e compreendi alguma coisa. Mas logo percebi que a agitação continuava: discretamente, os alunos trocavam papeluchos entre si, e um deles, com a ajuda da ponta de uma pena, jogava esses recados a um outro, o qual se regalava.
Na aula havia desordem como no recreio, o que era compreensível, pois, após tal excitação, os meninos voltavam despreparados para o estudo. Aquele jogo era o maior inimigo das aulas, uma vez que, atraindo exageradamente a atenção deles para uma diversão de importância secundária, tornava-lhes impossível uma preparação intelectual séria para acompanhar qualquer matéria. Os alunos, dissipados, estuantes e transpirando de torcida, iam aprender Latim: rosa, rosæ… rosarum…
No início de uma aula de cinquenta minutos, eles já estavam na impossibilidade de prestar atenção. Ora, quando o aluno perde os dez primeiros minutos da aula, tem uma grande dificuldade em captar o que o professor está dizendo. O resultado era a preguiça generalizada e pouquíssima aplicação. Não encontrando o fio lógico daquilo que era ensinado, eles começavam a brincar e causavam desordem dentro da sala. O professor fingia que não percebia, mas às vezes mandava algum aluno ficar quieto e punha-o de castigo. Continuava a aula e o punido fazia brincadeiras e micagens, com o que os outros entravam em consonância. Eles perdiam as aulas, por terem horror ao recolhimento e à concentração num tema abstrato, uma vez que a agitação lhes tinha dado a delícia do oposto.
O estudo tinha pouco aproveitamento, embora houvesse bons professores e ensino excelente.
As refeições no colégio
Eu era aluno semi-interno. Então, já naquele primeiro dia, almocei e tomei o lanche no colégio. Tive certa estranheza com os pratos, por serem feitos de material bem diferente daquele que eu conhecia.
Um professor anunciou no refeitório o horário em que seria a “merenda”, sem utilizar a palavra “lanche”, por ser reputada “desnacionalizante”. Entretanto, os alunos não usavam esse termo mais erudito, mas sempre diziam “lanche” e nunca “merenda”.
1 Situado na Avenida Paulista, em São Paulo.
2 Literalmente, “agir contra”: clássica expressão utilizada nos famosos “Exercícios Espirituais” de Santo Inácio de Loyola, indicando a necessidade de resistir ativamente às solicitações do mal (Cfr. Exer., 13, 16).
3 Consta que as aulas tiveram início no dia 10 de fevereiro, nesse ano de 1919. De fato, a narração faz pensar que o pequeno Procópio (Pinho) já havia começado a estudar quando fez o convite a seu primo Plinio. A matrícula de Plinio no Colégio São Luís tem a data de 20 de fevereiro, quinta-feira, o que torna possível que ele tenha comparecido às aulas pela primeira vez na segunda-feira seguinte, dia 24.
4 Plinio padecia de um acentuado desvio de coluna vertebral (ver p. <?>), que suscitava certa preocupação em Dª Lucilia, mas que os avanços ortopédicos da época não conseguiram corrigir. Exames radiológicos realizados por ocasião de um acidente automobilístico, sofrido por ele em fevereiro de 1975, acusaram esse desvio, tendo então declarado os médicos ser ele causa de incômodo, tornando penoso até o simples caminhar. O que explica certa incompatibilidade instintiva de Plinio com os exercícios físicos, desde a infância.
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